Os Alpes são das mais altas e belas montanhas da Europa, com uma paisagem toda feita de picos nevados e vales verdes, pontuados por mais de cem castelos só do lado italiano. Toda a região do vale de Aosta é uma mistura equilibrada de paisagens humanizadas e território agreste, e o adjacente Parque Nacional de Gran Paradiso é o culminar da beleza selvagem alpina.
No Vale de Aosta
A primeira impressão do vale de Aosta é a de uma zona fortemente industrializada, cuja estrada principal é permanentemente percorrida por grandes camiões de transporte internacional que se dirigem aos colos do Grand e do Petit-Saint-Bernard – o primeiro ligando o vale à Suíça, o segundo a França. Não se adivinha ainda o Grande Paraíso que está escondido nos Alpes. Sobretudo não se espere um vale bucólico e isolado; o ambiente ainda é bastante rural, com campos cultivados e extensos vinhedos – os mais altos da Europa -, à mistura com vilórias perdidas e quase desabitadas, feitas de casas de pedra que crescem invariavelmente em redor de um campanário pontiagudo. Mas muitas delas já foram reinventadas como estâncias de esqui, invadidas por prédios descabidos e comércios dedicados aos desportos de inverno, a maior parte fechada durante a maior parte do ano, à espera da época da neve.
Os nomes deixam dúvidas sobre estarmos ou não em território italiano: Pont-St-Martin, Issogne e St-Vincent são aldeias por onde passamos; hameau (aldeia) e rue são também palavras que aparecem escritas em placas, assim como pâtisseries (pastelarias) e supermarchés. A razão prende-se com a história da zona, ocupada pelos Francos desde 575, e onde a influência gaulesa foi sempre a mais forte, até datas bem recentes: a Casa de Sabóia tomou posse política e administrativa do vale do séc. XI à Revolução Francesa. No séc. XV, Aosta tornou-se um ducado com governo próprio, e em 1800 Napoleão atravessou o colo do Grand-St-Bernard com o seu exército. Com a constituição do Reino de Itália, a autonomia foi sendo várias vezes proposta até que, nos anos 40, Aosta adquiriu o estatuto de Região Autónoma. A história explica esta cultura “de fusão” na língua local, o valdostano, de rr bem carregados e aparentado com o provençal, mas também na profusão de castelos de todos os estilos.
Um Gran Paradiso nos Alpes
Encaixada entre os Alpes franceses e os suíços, esta é a mais pequena região de Itália, com menos de três mil e trezentos quilómetros quadrados, e também a menos povoada, com cerca de cento e dezoito mil habitantes. Está separada da Suíça por imponentes montanhas, entre as quais o Monte Cervino, que os helvéticos conhecem por Matterhorn; a sul fica o espectacular Parque Nacional Gran Paradiso, que tão bem merece o nome, partilhado com a província do Piemonte; a fechar o vale levanta-se a imensidão gelada do Monte Branco, que faz fronteira com a França. As cidades mais importantes são Courmayeur, que vive sobretudo do turismo de montanha, com destaque para o teleférico que leva à Aiguille du Midi, perto de Chamonix, e Aosta, a romana Augusta Praetoria, que chegou a ser o castro mais populoso dos Alpes antes de sofrer reveses às mãos dos mais variados invasores, dos Godos aos Bizantinos.
Como todos os vales alpinos, Aosta mistura paisagens encantadoras, povoações pequenas e uma natureza de aparência selvagem, mas facilmente acessível. Encontramo-la em estado puro, sobretudo nos vales laterais: o mais espectacular é o Valtournenche, que leva ao sopé do Monte Cervino. Mas do lado oposto, Valgrisenche, e sobretudo Val di Rhêmes, Val Savarenche e Val di Cogne são percorridos por estradas que terminam abruptamente numa paisagem paradisíaca de montanhas brancas, bosques escuros e prados percorridos por camurças, marmotas e cabras-montesas: é o começo do Parque Nacional Gran Paradiso, nome que lhe vem da cordilheira onde só penetra a pé, e cujo ponto mais alto, a 4.061 metros, está reservado a alpinistas experientes.
Do lado francês, a região também é protegida como Parque Nacional e tem o nome de Vanoise. Ambos oferecem uma rede de trilhos bem mantidos – do lado de Itália são cerca de duzentos quilómetros – que permitem um mergulho profundo na natureza e alcançar lugares isolados de uma beleza fantástica. Sucedem-se prados, cascatas, vales suspensos e aldeias abandonadas, habitadas agora por camurças e cabras-montesas.
Mesmo para quem não gosta de caminhar, a região reserva algumas surpresas, sobretudo na primavera: atraídas pelos primeiros rebentos de erva fresca, cabras-montesas e camurças chegam a descer até à estrada, onde é fácil apreciá-las a uma distância razoável. E há trilhos para todos os gostos e intensidades, desde o curto passeio ao longo da sucessão de cascatas de Lillaz, até à caminhada que leva ao refúgio Sella, e que vence um desnível de mil metros em três ou quatro horas. Seja qual for o grau de forma física, é indispensável conhecer este coração selvagem valdostano, percorrendo os seus vales e abandonando por alguns dias o verdadeiro rosário de castelos e monumentos que constitui o seu eixo central. Descobrir pequenos tufos de flores escondidas entre pedras, apreciar a luz ofuscante que sai da neve, os recortes dramáticos dos picos e os vales verdes lá em baixo.
Para quem só se desloca sobre rodas, o mínimo é aceder ao miradouro da Testa d’Arpi que, a 2.763 metros de altitude, num dia sem nuvens permite abranger o vale e o Monte Branco, um impressionante muro de montanhas de cumes nevados. Só para ter uma pequena visão do paraíso que há lá em cima.