Não há quem não se apaixone pelos Picos da Europa. Com sol ou com neve, os horizontes de montanhas e desfiladeiros que marcam esta região do norte de Espanha deixam sempre uma impressão forte – mesmo quando o nevoeiro entrega totalmente a paisagem à nossa imaginação…
Nos Picos da Europa
Os Picos da Europa, na Cordilheira Cantábrica (Espanha), são o que de mais parecido há na Península Ibérica com as paisagens de alta-montanha: montes caprichosos e recortados, geralmente escondidos em nuvens e muitas vezes salpicados com neve, florestas e prados verdes que se equilibram em encostas inclinadas, vales estreitos onde se alinham casas prontas para as intempéries de chuva ou gelo que podem chegar em qualquer altura do ano.
A região tem uma área de 646 km2 que se estende por três províncias – Astúrias, Cantábria e Leão -, é Reserva da Biosfera da UNESCO e está protegida pelo estatuto de Parque Nacional desde 1918 (foi o primeiro Parque Nacional de Espanha). O ponto mais alto é o Monte Cerredo, que chega aos 2.648 m de altitude. A proximidade do mar, que em alguns pontos está a menos de 20 km, e os desníveis acentuados deste maciço calcário criam condições climatéricas muito particulares, que incluem muita neve, chuva frequente e, sobretudo, muito nevoeiro em qualquer altura do ano.
As gargantas de Cares são um dos mais belos exemplos da extraordinária geografica dos Picos da Europa, e também um dos mais conhecidos; a pequena aldeia de Caín, por onde passa o trilho que as percorre, parece ter mais restaurantes do que casas de habitação. Os quilómetros que a separam de Posada de Valdeón são feitos de paredes de pedra, onde se entra e sai de túneis como se caminhássemos dentro de uma flauta. Um pouco por todo o lado, pelo menos num dia de chuva como o que nos tocou, há cascatas que escorrem até ao rio Cares, que corre lá no fundo em vários tons de verde. Tudo tão fotogénico que só mesmo uma chuva chata e um céu branco que descia até meio das paredes de pedra conseguiram afastar-nos dali – mas a jurar que voltamos.
Os lagos de Ercina e Enol foram outra história (de amor?). Situados perto da estrada, são o jardim das delícias das montanhas, mesmo para quem não gosta de caminhar. Valeu-nos a neve, que transformou o café no fim da estrada num lugar irresistível para a maior parte dos visitantes, e nos permitiu alguma “privacidade” no curto caminho que une os dois lagos – sempre debaixo de uma cortina de neve –, com tempo para apreciar a luz, o silêncio e o ar cortante de frio.
A partir daí, a neve não nos largou. E não há nada como a neve. O ranger das botas torna-se o único som no silêncio que impõe na paisagem, a luz parece sair da terra, em vez de do céu. Os lagos transformam-se em planícies, as esquinas e ângulos arredondam-se, e qualquer ramo, pinha ou folha ganha qualidades dramáticas ao cair naquele manto branco incandescente. Os nossos passos são únicos e ficam marcados no chão. E quando a neve atinge uma certa profundidade, ganham o azul gélido dos glaciares. Os flocos maiores agarram-se aos gorros, ombros, golas e mangas, transformam-nos em pequenos homens de neve; mais tarde teremos uma crosta estaladiça e fria como lembrança de um dia tão bom.
O nevoeiro não deixa ver para onde vamos, mas com a torrente de flocos que vai caindo sobre nós e o bosque transformado num eriçado de ramos escuros, as vistas deixam de ter importância. Temos a beleza da neve à nossa volta, o branco da neve e do céu misturados numa cortina translúcida que abre e fecha de surpresa, mostrando os pedaços mais bonitos da paisagem. Provavelmente era demais, se pudessemos ver tudo de uma vez…
A viagem aos Picos da Europa foi feita com a organização do Fotoadrenalina.