Das pedras parideiras e outros mistérios da Serra da Freita

Destaque / Destinos

Na Serra da Freita, o PR 5 leva-nos por uma planalto de pedras e flores, ao encontro de um milagre raro no mundo: as pedras parideiras de Castanheira. Mas esta é só uma das maravilhas desta serra…

Na Serra da Freita

Na Serra da Freita há muitos segredos para descobrir: o das pedras parideiras, que escondem no ventre outras pedras, o dos pequenos espaços sombrios de floresta que sobreviveram a anos sucessivos de incêndios, o dos tapetes de tojo, urze e carqueja que cobrem de cores os cabeços de granito cinzento, o das antas e antigas pontes de pedra, que assinalam uma presença humana antiquíssima, o das pedras boroas, esculpidas por uma meteorologia tão intensa como o lugar e o da presença milagrosa da água por todo o lado, que avança em riachos montanha abaixo, em todas as direções, criando obras de arte como marmitas de gigante e incontáveis quedas e cascatas.

A atividade geológica é, ou foi, tão intensa, que numa área pequena mas bem assinalada desde a criação do Geoparque Arouca, podemos encontrar estas e outras manifestações da vida do planeta Terra – como uma das maiores concentrações de trilobites gigantes do mundo, que podemos ver no CIGC Arouca (Centro de Investigação e Interpretação Geológica de Canelas), onde fica um museu que alberga alguns dos melhores exemplares.

Mas não é preciso ser geólogo, mesmo amador, para apreciar a beleza do lugar. A serra é pequena, mas a menos que por ali fiquemos uns dias, não conseguimos assistir à transformação do planalto numa espécie de Mongólia ao pôr-do-sol, à mudança de cor dos charcos, de verde musgo para azul petróleo; e se vier o nevoeiro, então, é impossível prever o que podemos descobrir dentro das nuvens opacas que sobem e descem pelos vales.

As PR, ou Pequenas Rotas são assinaladas a vermelho e amarelo

Felizmente a Freita também tem um outro “segredo”, mais prosaico mas essencial: uma rede de trilhos* razoavelmente assinalados e classificados por graus de dificuldade, que nos levam em todas as direções.

Tomemos o trilho PR15, por exemplo, e percorramo-lo a partir da Mizarela. O miradouro, recentemente refeito, não alcança até ao fim o cachão de água que cai de cerca de sessenta metros de altura. O vale estreito e coberto de floresta cerca o rio Caima, que aqui nada mais é que uma sucessão de piscinas naturais, de água transparente, onde sabe bem ficar de molho numa tarde de calor – mas para isso é preciso percorrer outro caminho.

Chagada a Castanheira pela PR 15

No PR15 continuamos cá no alto, e é por um misto de estrada rural de pedra e trilho de terra que passamos Cabaços, de ruas quase sempre vazias e ambiente medieval, subindo depois por uma encosta onde as pedras parideiras resvalam nos nossos pés até Castanheira, onde num pequeno mas interessante Centro de Interpretação desvendamos o segredo destas pedras que parecem dar à luz outras pedras.

O fenómeno é raríssimo, e consiste em nódulos com a forma de pequenos discos-voadores (quartzo por dentro e mica preta por fora), que se vão libertando de um bloco de granito por efeito da erosão e dos excessos de calor e frio que moldam a serra. As pedras que “nascem” são brilhantes, de um preto dourado – uma preciosidade, se comparadas com o vulgar granito cinzento das pedras-mãe.

Pedras parideiras: um fenómeno raro

O caminho continua por uma paisagem em bruto, onde a meteorologia e os incêndios foram pondo a nu um chão de pedra que parece ressequido, mas de onde brota água: aqui nasce o rio Caima numa zona de turfeiras, verdadeiras relíquias biológicas protegidas pelo sua elevada biodiversidade e capacidade de retenção da água das chuvas.

Pelo caminho encontramos túmulos pré-históricos: as Mamoas de Monte Calvo, junto à estrada, e uma bela anta que dá o nome à portela, no caminho do Vidoeiro – uma área onde alguns tufos de árvores e uma pequena floresta tentam cativarem alguma da vida selvagem que decerto já por aqui existiu, nomeadamente javalis.

Um piquenique com vista para as eólicas – onde uma rapina plana insistentemente, em busca da sua própria refeição – e regressamos por uma pequena área de planalto onde se destacam cabeços graníticos, alguns dos quais esculpidos pela erosão de modo a ficarem com o aspeto de broa: as pedras boroas. Este é definitivamente o reino da pedra, e só as cores da urze, do tojo e da carqueja emprestam alguma cor ao cinzento rude da paisagem. As construções antigas que encontramos, como muros e moinhos, confundem-se na cor e destacam-se na forma: obrigar a pedra a formar linhas retas, como as lajes dos telhados dos moinhos ou os muretes altos, quase Incas, que apoiam os socalcos de milho, parecem obra de super-homens.

O trilho traz-nos de volta a Albergaria da Serra, de onde, passando pela pequena praia fluvial, podemos regressa à Mizarela e a uma esplanada que parece ter como única função servir bebidas frescas a quem termina uma caminhada. Na nossa frente fica o mar, uma presença azul e horizontal que contrasta com o cinzento e o verde vertical da serra. Não tenho vontade de deixar este mundo mineral e descer para a costa; por mim, ficava por ali a caminhar pelo planalto, enquanto o pôr-do-sol pinta o pico de S. Pedro Velho de dourado…

 

*Existe um mapa útil com todos os trilhos e informações necessárias, que vai da GR 28, uma Grande Rota que promete mostrar toda a serra, àPR15, uma Pequena Rota circular que começa e acaba no Merujal (nós começámos na Mizarela), e que se faz em 5 a 6 horas. O mapa encontra-se disponível no Turismo de Arouca, no Parque de Campismo do Merujal e no Centro de Interpretação, em Castanheira.

Mais informação: http://aroucageopark.pt/pt/


Pub


Quando viajo faço sempre um seguro de viagem pela Nomads


Deixe o seu comentário!